quinta-feira, 28 de agosto de 2008

O Sapo, de Rubem Alves

Era uma vez um lindo príncipe por quem todas as moças se apaixonavam. Por ele também se apaixonou uma bruxa horrenda que o pediu em casamento. O príncipe nem ligou e a bruxa ficou muito brava. “Se não vais casar comigo não vai se casar com ninguém mais”! “Olhou fundo nos olhos dele e disse: " Você vai virar um sapo! “Ao ouvir essa palavra o príncipe sentiu um estremeção”. Teve medo. Acreditou. E ele virou aquilo que a palavra de feitiço tinha dito. Sapo. Virou um sapo. Bastou que virasse sapo para que se esquecesse de que era príncipe. “Viu-se refletido no espelho real e se espantou”: “ Sou um sapo”. Que é que estou fazendo no palácio do príncipe? “Casa de sapo é charco". E com essas palavras pôs-se a pular na direção do charco. Sentiu-se feliz ao ver a lama. Pulou e mergulhou. Finalmente de novo em casa. Como era sapo, entrou na escola de sapos para aprender as coisas próprias de sapo. Aprendeu a coaxar com voz grossa. Aprendeu a gostar do lodo. Aprendeu que as sapas eram as mais lindas criaturas do universo. Foi aluno bom e aplicado. Memória excelente. Não se esquecia de nada. Daí suas notas boas. Até foi o primeiro colocado nos exames finais, o que provocou a admiração de todos os outros sapos, seus colegas, aparecendo até nos jornais. Quanto mais aprendia as coisas de sapo, mais sapo ficava. E quanto mais aprendia a ser sapo, mas se esquecia de que um dia fora príncipe. A aprendizagem é assim: para se aprender de um lado há de esquecer do outro. Toda aprendizagem produz o esquecimento. (...) Que este texto seja em homenagem a todos os sapos da Natureza e a todos os sapos que foram transformados por feitiços de crença, ilusão e medo, mas que podem transformar-se no que quiserem,quando descobrirem QUEM realmente são (príncipes, aventureiros, atletas, escritores, artistas...). Aprender é desaprender. Há coisas que precisamos desaprender e outras que precisamos tomar cuidado pra não perder. Como educadores, teremos a delicadeza de não permitir que nossas crianças desaprendam coisas essenciais à vida e à felicidade.
Na experiência que fiz com este texto, contei a história e depois eles foram convidados a pegar uma folha de papel, dividir ao meio e escrever no alto, de um lado "sapo", de outro, "príncipe" ou "princesa". Depois, num diálogo consigo mesmo, escreveram sobre seus momentos-sapos e seus momentos-princesas e conversaram entre si. Em quantos feitiços bobos temos acreditado? Pense nisso: "Qualquer coisa que você possa fazer ou sonhar, você pode começar. A coragem contém em si mesma a força e a magia." Goethe.
(do livro "A Alegria de Ensinar", Ed. Papirus)